Passeando pela zona rural daqui de Pelotas, eu e a Cláu paramos para ver um cemitério de uma colônia (provavelmente pomerana), e descobrimos o que parece ser um costume no mínimo curioso.
Além dos inúmeros túmulos de crianças, quase todos da década de vinte — alguns em número de seis ou sete, enfileirados, com o mesmo sobrenome apenas, sem nome (talvez tentativas em série de filhos que não vingaram) —, o que mais havia era túmulos de casais. E o costume curioso é que, em muitos dos túmulos recentes, junto ao nome da esposa consta apenas a data de nascimento, ou seja, o homem já morreu, mas a mulher ainda vive!
No início, achamos que não passava de coincidência, que haviam arrancado os números da lápide, ou algo assim. Mas era sempre a data da morte que faltava, logo, não podia ser coincidência: aquelas pessoas ali nominadas, ainda não estão ali.
Esse costume, se é que é um costume (e ignoro se vem de outros lugares ou se é espontâneo daquela localidade) me pareceu algo como uma declaração de compromisso: “não casarei com mais ninguém – ou, mesmo que me case de novo, no fim, meu lugar é bem aqui do seu lado”. Lembrou-me, de passagem, aquele sinistro e desumano costume, na China antiga, de sepultar vivas as esposas com seus maridos mortos. Mais tarde, lá na China, alguém teve a feliz ideia de que bastava colocar uma réplica da mulher, feita em pedra, para acompanhar o cadáver.
Já, no cemitério pomerano que visitamos, as esposas, felizmente, não são sepultadas vivas com seus esposos mortos, tampouco o são suas réplicas esculpidas, mas seus nomes sim – e eu diria que, se elas não são enterradas ali, pelo menos já colocam um pé na cova como promessa.
Havia alguns túmulos em que os dois, homem e mulher, ainda não tinham suas datas de morte, apenas de nascimento, ou seja, o casal está vivo e com a sepultura pronta – o que me pareceu, além de uma tremenda consciência tranquila da mortalidade, algo como um contrato perante a sociedade, uma garantia de matrimônio a toda prova, declarado da forma mais grave: fazendo de um túmulo uma aliança. E tem até foto! Imaginem visitar o próprio túmulo e ver seu nome e sua foto ali, com o espaço vago faltando apenas a data da morte.
MEMENTO MORI ao extremo.