Precisamos soltar para viver.
Frequentemente, na sociedade da exigência e da hiperconectividade, projetamos equivocadamente uma imagem que pretende ser perfeita. O erro já não é mais permitido desde que cremos ter o nous aristotélico no celular, desde que podemos escolher o perfil que mostramos aos demais. Esta submissão ao juízo alheio nos converte em uma representação distante de nossa verdadeira identidade. Deste modo, o personagem acabará nos devorando e o fará começando pela liberdade que nos define.
Poucos assuntos são mais repugnantes para o ânimo que não poder revelar nosso rosto pelo imperativo da máscara. Ser livre é se permitir errar, passar momentos vergonhosos e envergonhantes, e fazer o que se agrada sempre que não faça mal a um terceiro. Não é necessário que sejamos virtuosos. Está bem isso de “ser a melhor versão de nós mesmos”; mas é que às vezes não somos a melhor versão de nada, e também está bem.
Me vem à memória o albatroz de Baudelaire: a falta de jeito com que perambula pelo convés do barco, inepto por suas próprias asas, humilhado pelos marinheiros. É uma imagem que faz referência ao que destoa, ao que sai do molde e se põe em evidência.
Mas quem sabe se a ave errática não está simplesmente aborrecida de voar, se cansou-se de cumprir expectativas?
Sem saber a resposta, gosto de pensar que sim, enquanto danço se ter nem ideia.