Como é que mineiro escolhe advogado?
Nada mais simples:
— Imagina o doutor que eu comprei essa fazendinha, coisa de nada. Pois não é que o meu vizinho, que tem um fazendão, não vai criar pendenga comigo por causa dum pedacinho de terra à toa? Comprei de papel passado e tudo, diz que meu terreno vai até o riacho, além da cerca dele. Ele diz que aquele pedaço é dele, por usucapião, está ocupado há mais de 30 anos, pode provar… Plantou uma árvore lá quando chegou…
— Você tem escritura registrada, tudo direitinho? Os documentos do antigo dono estavam em ordem?
— Tudo direitinho, doutor. Tudo em ordem.
— Então deixa comigo. A causa está ganha.
— E a árvore?
— Que árvore nada: uma árvore não prova coisa nenhuma.
Ele agradece e vai saindo de fininho. Parte para outro advogado, e a conversa se repete.
Assim, de advogado em advogado, acaba encontrando um que se recusa a aceitar a causa:
— Usucapião mesmo, ali no duro. Nesses casos, a posse é que conta. Ele pode provar, é fácil arranjar testemunha. Essa gente é tinhosa. E tem a tal árvores que ele plantou há mais de 30 anos… o senhor vai perder na certa.
— Então é o senhor mesmo que eu quero – diz o mineiro. — Eu sou o outro. O da árvore.
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Fernando Sabino: “Mineiro por mineiro”, in “A falta que ela me faz”. Editora Record, 1980. p. 92