Sou gaúcho por fatalidade. Como qualquer pessoa é isso ou aquilo por fatalidade. Ninguém escolheu falar esta ou aquela língua. Falar uma língua é aprender um jeito de apreender o mundo.
Sou gaúcho. Sou brasileiro. Isto não me torna melhor nem pior do que ninguém.
É engraçado ter orgulho da fatalidade. Ao mesmo tempo, é estranho não senti-lo. Quem me olha de fora vê um gaúcho. Um rio-grandense, de fala mais percussiva e grave do que em outras localidades brasileiras. Quem olha mais de longe ainda, vê um brasileiro. Mais de longe, um latino-americano. Um terceiro mundista. Um ser humano. Terráqueo. Um habitante da longínqua via-láctea.
Que celebremos nossa fatal humanidade. Que hoje o dia sirva para mais uma desculpa, para celebrar o fato de não termos de pedir desculpa para ninguém por nascermos onde nascemos, fazermos o que fazemos e sentirmos o que sentimos.
Celebrar uma herança verdadeira. Não uma herança inventada.
Eu tomo chimarrão – e estou fazendo isso agora – porque eu gosto. Gosto mesmo. Ninguém me obrigou a tomar esse mate. Mas sei que sou índio ao fazê-lo. Esse mate não carrega nenhum peso de nenhuma tradição. Ele é tradição sem querer.
O mate não é culpado de nenhuma degola, traição, rebelião, feito heróico ou coisa que o valha. O mate é testemunha das coisas belas e das besteiras que fizemos e faremos todo o dia.
Que o mate testemunhe no futuro cada vez mais nossa capacidade de estarmos tranquilos em sermos o que somos.